domingo, 3 de julho de 2011

Habeas Corpus


EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
 








PROCESSO Nº:


IMPETRANTE, brasileiro, solteiro, advogado, inscrito na OAB/ES sob o nº__ , com endereço profissional na Rua __ , Cidade, Estado, onde recebe notificações e intimações, vem “mui” respeitosamente à presença de V. Exa., com fundamento nos artigos 647 e 648 do Código de Processo Penal e artigo 5º, inciso LXVIII da Constituição da República, impetrar a presente ordem de

HABEAS CORPUS

em favor de PAULO BARBOSA, brasileiro, casado, profissão, residente e domiciliado na Rua ___, Bairro, Cidade, Estado, tendo por fundamento as razões de fato e de direito a seguir expostas.

DOS FATOS

O paciente foi processado e condenado, nos autos do processo nº ___, pela prática do crime de incêndio, previsto no artigo 250 do Código Penal. A sentença condenatória encontra-se transitada em julgado, e por força da mesma o paciente encontra-se recolhido em estabelecimento prisional para cumprimento da pena de 6 (seis) anos de reclusão que lhe foi cominada.

Ocorre que, examinando os autos, nota-se que não foi realizado exame de corpo de delito, direto ou indireto. É sabido que a realização de tal exame seria indispensável para que pudesse haver a condenação, de modo que deve ser reconhecida a nulidade absoluta do processo, como será demonstrado a seguir.

A sentença teve por fundamento apenas a confissão de Paulo Barbosa e a declaração de sua esposa, que, conforme consta dos autos, nem mesmo presenciou a ação. Ressalte-se, ainda, que de acordo com o que foi apurado pelas declarações dos mesmos, o fogo limitou-se a queimar todos os móveis do casal.

O processo de conhecimento tramitou na 2ª Vara Criminal de Vitória e a guia de execução encontra-se na Vara de Execução Penal da Comarca de Linhares, município onde o paciente encontra-se preso.

DO DIREITO

Como narrado acima, o paciente foi condenado pela prática do crime de incêndio, sem que houvesse a realização de qualquer perícia no local em que ocorreram os fatos. Por ser o incêndio crime que deixa vestígios, a verificação do perigo concreto e comum deve ser feita mediante exame de corpo de delito direto ou indireto. É o que diz o artigo 158 do Código de Processo Penal:

Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.

Como se depreende do dispositivo legal transcrito, a realização do exame de corpo de delito era indispensável para a condenação, sendo inviável que a mesma se baseasse na confissão do acusado e no depoimento de pessoa que nem mesmo presenciou os fatos supostamente ocorridos. O diploma processual penal é ainda mais específico ao tratar da hipótese de incêndio. Vejamos: 

Art. 173. No caso de incêndio, os peritos verificarão a causa e o lugar em que houver começado, o perigo que dele tiver resultado para a vida ou para o patrimônio alheio, a extensão do dano e o seu valor e as demais circunstâncias que interessarem à elucidação do fato.

Tendo em vista que, à época em que a autoridade policial tomou conhecimento do fato, os vestígios ainda poderiam ser detectados pela perícia oficial, a prova da materialidade não poderia ser suprida pelas testemunhas (art. 167 do Código de Processo Penal).

Nos mesmos sentido do que foi exposto acima, a ementa a seguir transcrita, de acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Habeas Corpus nº 65.667 – RS:
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS . CRIME DE INCÊNDIO. AUSÊNCIA DE EXAME PERICIAL. NECESSIDADE. ARTS. 158 E 173 DO CPP. MATERIALIDADE NÃO COMPROVADA. ORDEM CONCEDIDA.1. Relativamente às infrações que deixam vestígios, a realização de exame pericial se mostra indispensável, podendo ser suprida pela prova testemunhal apenas se os vestígios do crime tiverem desaparecido.2. Na hipótese, tratando-se de delito de incêndio, inserido entre os que deixam vestígios, apenas poderia ter sido comprovada a materialidade do crime por meio de exame pericial, já que os vestígios não haviam desaparecido.3. "No caso de incêndio, os peritos verificarão a causa e o lugar em que houver começado, o perigo que dele tiver resultado para a vida ou para o patrimônio alheio, a extensão do dano e o seu valor e as demais circunstâncias que interessarem à elucidação do fato" (art. 173 do CPP).4. Ordem concedida para restabelecer a sentença absolutória.

É o mesmo entendimento manifestado pela Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, no julgamento da Apelação Criminal nº 76.312, que decidiu pelo reconhecimento da nulidade absoluta da sentença condenatória pelo crime de incêndio, proferida sem a realização de perícia, conforme ementa transcrita abaixo:

CRIME CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA. INCÊNDIO. MATERIALIDADE. AUSÊNCIA DE PERÍCIA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 158, 173 e 564, INC. III, ALÍNEA 'B', DO CPP. ABSOLVIÇÃO. RECURSO PROVIDO.O crime de incêndio, sobretudo na sua forma consumada, sempre deixa vestígios, o que atrai a incidência obrigatória dos arts. 158 e 173, do CPC, cuja inobservância, além de traduzir nulidade absoluta (art. 564, inc. III, alínea 'b', do CPP), acarreta a não comprovação da materialidade do delito.

Diante de todo o exposto, não deve subsistir a condenação imposta ao paciente, em face da ausência de perícia idônea a configurar a materialidade do crime. De acordo com os dispositivos legais acima transcritos, bem como a jurisprudência indicada, deve ser reconhecida a nulidade da sentença condenatória, nos termos da alínea b do inciso III do artigo 564 do CPP:

Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:[...]III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:[...]b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no Art. 167;

Justamente para afastar tais situações de constrangimento à liberdade fundadas na ilegalidade, é que a Constituição da República prevê, em seu artigo 5º, inciso LXVIII, entre as garantias fundamentais do cidadão, o remédio do Habeas Corpus:

LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;
A hipótese configurada no presente caso também está prevista no inciso VI do artigo 648 do Código de Processo Penal:


Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal:
[...]
VI - quando o processo for manifestamente nulo;
            
DOS PEDIDOS

Assim, espera que seja concedida a presente ordem de Habeas Corpus, requerendo, como medida liminar, a expedição do competente alvará de soltura em favor do paciente. No mérito, postula seja declarada a nulidade absoluta do processo nº ___, que culminou com a condenação do paciente à pena de 6 anos de reclusão.


Nestes termos, pede deferimento.

Vitória – ES, 13 de maio de 2011.

IMPETRANTE.

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